No dia 27 de março de 2019, o Tribunal de Contas da União (TCU) proferiu o Acórdão nº 721/2019, no âmbito de um processo de auditoria¹ realizado em 2017, que identificou diversas irregularidades na análise, pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), da prestação de contas de projetos audiovisuais que receberam recursos públicos derivados de fomento direito ou indireto.
A referida decisão condenou a metodologia Ancine+Simples, sistema até então adotado pela agência que consiste do uso de amostragem para selecionar os processos de prestação de contas que receberiam análise completa da Ancine. Ao identificar descompassos com o ordenamento jurídico, o TCU estabeleceu determinações à Ancine que deverão resultar em alterações no texto das Instruções Normativas nº 124 e nº 125 e, consequentemente, no atual sistema de prestação de contas. Dentre as principais determinações do TCU estão:
(i) a realização de ajustes às normas internas da agência para que se exclua a possibilidade de (a) classificar falhas materiais em meras falhas formais resultantes de ressalvas (ex: não identificação do projeto nos comprovantes de despesas e apresentação de um mesmo documento fiscal na prestação de contas de projetos distintos); (b) comprovar contrapartida por meio de doação e sem o devido documento fiscal; (c) tomada de decisão fundada em informações meramente declaratórias; e (d) realização, pelas proponentes, de pagamentos em seu próprio favor e de pagamentos a empresas com coincidência entre os quadros societários ou entre os endereços empresariais, chamados de “autocontratos”);
(ii) apresentação ao TCU de plano de ação para reanálise das prestações de contas de todos os projetos audiovisuais aprovados, com ou sem ressalvas, sem a análise complementar prevista na Instrução Normativa nº 124, sendo certo que deverão ser analisados todos os documentos comprobatórios das despesas referentes aos projetos;
(iii) promoção, por ocasião da reanálise da prestação de contas, da glosa de (a) pagamentos realizados a título de tributos pessoais; e (b) despesas realizadas a título de contrapartida por meio de doação e sem a devida comprovação por documento fiscal;
(iv) regulamentar de forma mais precisa o uso a ser dado aos recursos públicos, para que sejam concentrados em atividades que representem melhor o fomento cultural, evitando-se elevados percentuais de despesas acessórias (ex: despesas com passagens, alimentação, tarifas bancárias, dentre outros).
Apesar de a Ancine, em nota, informar que o TCU não realizou um comando direto de interrupção do investimento dos recursos, o acórdão trouxe disposição expressa determinando que somente sejam celebrados novos acordos para a destinação de recursos públicos ao setor audiovisual quando a Ancine e o Ministério da Cidadania (como sucessor do Ministério da Cultura) dispuserem de condições técnico-financeiro-operacionais para análise das prestações de contas.
Embora o acórdão em questão aborde a “celebração de novos acordos”, indicando que a vedação se aplicaria apenas aos recursos de fomento direto, a Ancine, em sua nota, em tese, optou por uma interpretação conservadora, ao afirmar que a decisão do TCU prevê que a agência somente poderá “celebrar avenças (aprovar, acompanhar e fiscalizar projetos)” na medida que tiver capacidade operacional.
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¹ TC 017.413/2017
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